sábado, 26 de março de 2011

A imbecilidade musical de hoje ou Meu ouvido virou penico de vez!

Você aí que lê esse blog tem, minimamente um interesse qualquer por música. Já se perguntou quanta poluição sonora a gente ouve por aí? Não estou falando de buzinas, ronco de motores nas ruas, bebês chorando ou coisas do tipo. Digo sobre o quanto de lixo musical a gente recebe todos os dias. É tanta coisa ruim de ouvir e a gente não se toca que acostumamos mal nossos ouvidos.

Queria falar sobre isso há muito tempo mas agora foi a gota d'água. Tem um vídeo de uma garota chamada Rebecca Black no Youtube cantando uma música chamada "Friday". É difícil dizer algo diferente, mas perto dela, Justin Bieber é Beethoven.

 CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!
 CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!  CUIDADO!

Até a hora em que eu vi o vídeo, o contador mostrava 54 MILHÕES de visitas desde fevereiro desse ano. Só pra vocês terem um comparativo, "Alejandro" da Lady Gaga teve 130 milhões e "Never Say Never" do Justin Bieber teve 176 milhoes. Além disso, ela estrou nessa semana como 72a música nas paradas americanas e 2a música mais procurada na Billboard. E "Friday" não teve propaganda na TV, nem estréia mundial nem passou no Fantástico (até agora...). Tive também o cuidado de procurar por entrevistas e outras notícias sobre a garota e sua música e foi muito curioso o que achei.

O noticiário americano chega a exaltar a garota e conversa sobre o cyberbullying que ela vem recebendo devido às críticas de seu trabalho. E, surpreendentemente, achei também uma reportagem na Mtv falando sobre seu sucesso (nesse vídeo, até Lady Gaga elogia a garota). Mas isso não quer dizer que não vi nenhuma crítica. Achei várias paródias e videoblogs falando sobre como a música é horrível.

O que me incomoda nessa história é que a mídia não quer ou não se importa em discutir a qualidade musical de certas canções. Uma garota botar em uma letra de música que "quinta vem antes da sexta" e "sábado vem depois da sexta" é de uma imbecilidades sem tamanho! É como se todos fizessem vista grossa sobre o que ouvimos. É como a Globo trata as outras emissoras de tevê, ou seja, as outras emissoras abertas não existem: nunca comparam, nunca citam seus nomes, só existe a Globo.

E o que tem a ver uma música americana com nosso dia a dia brasileiro: Absolutamente TUDO! Além do país consumir muita música internacional, somos bombardeados todos os dias com todos os tipos de música de qualidade duvidosa. Quem já nunca ouviu um funk com letras de cunho sexual extremamente pesadas? Axés de duplos sentidos vergonhosos? Ou músicas sertanejas repetitivas e com a mesma temática incessante do chifrudo que quer voltar para a mulher? Ou, quem sabe, até outro tipo de sertanejo, disfarçado de rock, - conhecido como Restart e derivados? Todos os dias esse tipo de lixo é responsável pela impregnação do ar nas nossas cidades.

Longe de mim querer criticar quem gosta de certos tipos de música. Tenho minhas preferências musicais e garanto que a maioria delas não são nem de longe coisas geniais ( reconheçco, a maioria das coisas que gosto pode ser extremamente chata e estúpida para alguns). Quero discutir aqui a que ponto chegamos. Não nos preocupamos com o que entra nos nossos ouvidos. E aí está um grande erro. Muita gente não tolera ver algo considerado feio ou comer comida ruim. Tratamos muito mal nossos ouvidos, mesmo que esse maltrato seja feito por terceiros: aceitamos carros de som alto nas ruas, toleramos qualquer pangaré colocar um amplificador em uma praça e sair "divulgando seu trabalho", o mesmo faz os grandes magazines, seja com música mecânica ou um trio de metais qualquer na porta da loja (isso realmente ajuda a angariar clientes?). Toleramos até mesmo qualquer pessoa ouvindo celular alto nos espaços públicos ou nos meios de transporte.

E enquanto isso, vamos cagando e andando para nossos ouvidos. Eu, pelo menos, gosto de outras músicas que falam sobre sexta-feira:

segunda-feira, 14 de março de 2011

Talking Heads e sua cauda longa


Há poucos dias lembrei de uma banda antiga que conhecia muito pouco. Pra corrigir esse meu erro, ouvi seus discos e fiquei surpreso com duas coisas: a primeira é de que conhecia mais musicas deles do que pensava. A segunda é de que confirmei como a banda influenciou - direta ou indiretamente - o som da quase totalidade do que a gente conhece hoje como som "indie", que surgiu na década de 1980, se diluiu nos anos 1990  e reapareceu a partir dessa última década.

Para mim, eles fizeram mais que influenciar. Vou me arriscar aqui a cometer uma possível heresia - do que adianta escrever sem criar polêmica? Talking Heads foi o precursor, o marco zero, do que hoje chamamos de indie rock. O som da banda se baseia em música pop, punk rock, world music e o que chamam de art rock. O segredo da banda, pra mim, foi conseguir misturar uma certa crítica cotidiana nas letras com uma pitada de experimentalismo, transformando o que seria supostamente chato em algo extremamente palatável e, até certo ponto, de alto astral, dignos do que o rock é capaz de fazer.

O som da banda influenciou uma leva grande de bandas e músicos. Usando pouco esforço, dá pra comparar e perceber certas semelhanças nos sons de bandas recentes com o que o Talking Heads começou a fazer a mais de 30 anos atrás. Pra isso, classifiquei o som do Talking Heads em fases distintas, pra ficar melhor de explicar.

A primeira fase do Talking Heads  é muito puxada pro que a gente pode chamar de pós punk. É um som mais de banda de garagem e incluo os 3 primeiros álbuns: "77", "More Songs about Buildings and Food" e "Fear of Music". Franz Ferdinand e várias outras bandas do gênero (Futureheads, Maximo Park, The Rakes) lembram muito TH dessa época. Olha só:

Talking Heads - Found a Job

Franz Ferdinand - The Dark of The Matinee

The Rakes - Work, Work, Work (Pub, Club, Sleep)


Considero a segunda fase do Talking Heads uma mistura entre o rock e elementos mais dançantes, provavelmente misturando elementos da disco e algum experimentalismo. "Remaining in Light" e "Speaking in Tongues" são os dois álbuns que tem as sonoridades parecidas. Dessa leva, alguns sons lembram muito LCD Soundsystem.

Talking Heads - Once in a Lifetime

LCD Soundsytem - Home

A terceira fase é a mais pop e foi com os álbum "Little Creatures" e o "True Stories" que a banda fez sucesso com músicas mais palatáveis. Apesar de ser pop, a banda começa a introduzir sons mais experimentais , além de uma marcação mais caribenha. As músicas de maior sucesso comercial estão nessa fase e, antes de muita banda, eles começaram a fazer o povo dançar. B52's e REM são influenciados por essa fase do TH. Ouve:

Talking Heads - Love For Sale (1986)

B52's - Love Shack (1989)

A quarta e última fase mostra um som mais world music, com elementos africanos e brasileiros se incorporando ao som da banda. O álbum que mais tem essa roupagem é o "Naked", de despedida do quarteto. Paul Simon e Vampire Weekend beberam muito dessa fonte...


Talking Heads - (Nothing But) Flowers

Vampire Weekend - Cape Cod Kwassa Kwassa

Antes de terminar, deixo três curiosidades do Talking Heads:

* Radiohead só tem esse nome por causa de uma música homônima do Talking Heads, do álbum "True Stories". A música nem tem a ver com o som da banda do Thom Yorke, mas fica o registro.

* "(Nothing but) Flowers" foi a música do Talking Heads que protagonizou um episódio emblemático no showbiz brasileiro. Caetano Velozo, no VMB 2004, perdeu a linha - e com razão - depois do som ter flahado duas vezes na hora em que ele e David Byrne (vocalista remanescente da banda) foram tocar a música no prêmio. O link está aqui e vale a pena dar uma olhada!

* David Byrne gostou tanto dessa idéia de fazer sons brasileiros que hoje ele é figurinha fácil em álbuns de cantores brasileiros: Naná Vasconcelos, Marisa Monte, Tom Zé, Margareth Menezes são alguns dos músicos brasileiros que já gravaram com ele.